Nanã : a dona da lama !

Nanã : a dona da lama !

Por Eneida Salles Damazio

Estamos  fechando a Semana da Mulher Negra do nosso site. Exaltamos a força das mulheres pretas num país que ainda as vê numa condição subalterna, como se ainda estivessem nas senzalas e nas cozinhas das casas grandes.

Dia 26 de julho, é o dia pela Igreja Católica de Santana, avó de Jesus, no sincretismo religioso da Umbanda, assim neste dia o povo do santo celebra Nanã Burucu, ou simplesmente Nanã.

Santuário Nacional de Umbanda

Arquétipo de Grande Mãe, como um dos orixás mais velhos, é também o arquétipo da avó, muitas vezes  aquela avó severa, até  mesmo ranzinza.

Porém esse orixá é muito temido pelos participantes do culto,  principalmente pelos praticantes da umbanda , que a veem como a própria Morte.E em tempos sombrios como estes nossos, vemos com mais frequência essa face sombria de Nanã.

Contudo, no dia de hoje ao fecharmos esta semana tão especial, queremos brindar, festejar, de Nanã a sua face esplendorosa, a face que produz a vida, pois também estamos celebrando a força da mulher, do princípio feminino tal como os povos da África nos ensinaram ao chegarem aqui.

Eis o itã que mostra a imensa força de criação de duas Iabás na sua ânsia por ofertar-nos a Vida:

Criar, gerar é coisa de mulher e um dia Ólorum, cansado da perfeição plácida do Órun,  onde erguera seu palácio transparente de tão branco que era, resolveu  que deveria criar algo para além da Não- Existência.

Resolveu criar o Aiê – a Terra –, e que seria uma cópia de muitas das coisas que havia no Órun, mas como uma diferença fundamental: seria um lugar em que tudo que a formava, em que os seres que a habitariam seriam formados por matéria perecível, portanto subjugados a morte, a Iku….

Mas isso é outra história.

Então Ólorun chamou todos os orixás Funfun e pediu a seu filho, Oxalá, que comandasse a empreitada. Pediu da mesma forma que sua irmã, Odudua,  o acompanhasse.

Porém, o que os orixás não sabiam é que o Senhor Supremo , já havia decidido que Oxalá deveria falhar na primeira tentativa de completar a tarefa. E Oxalá deveria falhar porque Ólorun queria dar a sua filha uma chance de também se destacar na criação da Existência. Como pai não queria demonstrar predileções ou causar ciúmes entre seus filhos.

Após o fracasso  – provocado por Exu que cumpria as ordens que recebera secretamente da própria Odudua –  todos os orixás já estavam de volta ao belo palácio de cristal, exaustos e envergonhados pelo fracasso,

Odudua, no entanto, foi levada de imediato  até Ólorun que lhe disse, sem rodeios:

– Filha, você deve ir até o Opo-Orun-oun– Aiê, nos limites dos nosso reino. Quando você  chegar lá, verá um pilar que une o Orun ao vazio do Infinito. É precisamente neste local que você deverá criar o Aiê, o mundo dos mortais. Leva contigo o saco da Existência e procede de acordo com as orientações que já dei a Oxalá.

-Será no Aiê que você reinará, e será conhecida como a Senhora da Vida e da Morte.

Assim procedeu Odudua e, por sua vez, foi outorgando a cada um dos orixás que faziam parte doo seu séquito uma tarefa na formação do novo mundo.

E então  quando chegou a vez de Nanã, a água  já havia sido criada, mas a terra ainda não.

Odudua, em tom imponente, ordenou a Nanã, mas com imensa reverência por se dirigir ao orixá feminino mais velho, :

 – Saluba, Nanã. A ti outorgo o comando da lama para que separada da água, surja a terra sólida que permitirá a existência de todo ser vivo no Aiê.

 Deste modo, por determinação de Odudua e pelas mãos de Nanã, a lama e a terra passaram a ser elementos primordiais da criação. Tornaram-se o início e o fim de tudo que vive e perece .

Assim mais do que estar ligada à morte, Nanã com sua lama é a Iabá que possibilita a Vida.

Saluba Nanã Burucu !

Fonte de Consulta:

 Adilson de Oxalá. Igbadu, a cabaça da existência: mitos nagôs revelados. Editora Pallas..

Saiba Mais:

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Eneida Damazio

Eneida Damazio

Eneida é mestre em Literatura Brasileira, Estudante de Jornalismo e aficionada por cultura e seus movimentos.