Cacique de Ramos e o Carnaval carioca

Por William Martins

O início do século XX no Rio de Janeiro foi de intensas mudanças tanto no campo social como cultural. Além das transformações propriamente urbanas ou arquitetônicas, mudanças culturais também puderam ser observadas, como no carnaval carioca. O jogo do entrudo, antiga forma de carnaval, passou a ser considerado como perigoso e pernicioso, tendo sido substituído por formas mais controladas que também passaram a contar com a participação dos setores médios urbanos e da elite carioca. Embora os sucessivos governos tivessem efetiva intervenção na vida cultural da cidade – como a proibição do entrudo, a tentativa da criação de um teatro nacional, a proibição de jogos de azar, dentre outras – as opções aumentaram independentemente da vontade deles, sendo fruto da própria modernização urbana.

Uma das tentativas de mudança no carnaval foi a expulsão da figura do índio como fantasia do carnaval, que deveria ser trocado pelas figuras europeias, como as fantasias do Pierrô e da Colombina. Na época, os jornais apresentavam diversas charges justamente mostrando o Pierrô chutando o índio das festividades de Momo.

O ano de 2020 trouxe com espanto críticas ao Cacique de Ramos juntamente pela utilização da vestimenta de índio. É claro que por motivações diferentes, mas ainda hoje queremos retirar a fantasia do índio do carnaval. Carnaval é a festa da inversão. Um dos preceitos básicos do carnaval é você se vestir diferente daquilo que você é o resto do ano.

A discussão do politicamente correto é importante e não podemos perder de vista, mas não da para colocar tudo no mesmo saco. Por exemplo, o black face tem uma origem tão racista que sair dessa forma é muito complicado, tal como outras vestimentas, mas não é o caso do Cacique de Ramos. O Cacique está na cultura carioca há 60 anos,  de lá surgiram expoentes do Carnaval. O seu surgimento tem relação com o sagrado e como o profano. Essa suposta missão civilizatória de conscientizar acaba caindo no campo do grotesco.

Para terminar essa primeira coluna deixo com vocês uma fala de João do Rio:

-Que ganhei? Não sejas idiota, pelo amor de Deus, Divertir-me, gritei, berrei, bebi, ri, corri, não dormi! Estraguei a saúde, estraguei a algibeira. Achas pouco? Se o carnaval não existisse era preciso inventá-lo. Porque ao cair da cinza é que a gente vê o que o fogo da alegria foi de lucro só para os que não se divertem no carnaval….

Eneida Damazio

Eneida Damazio

Eneida é mestre em Literatura Brasileira, Estudante de Jornalismo e aficionada por cultura e seus movimentos.