O ministro das diversões do Rio de Janeiro

O ministro das diversões do Rio de Janeiro

Por William Martins

“Antes de mais nada, meu caro leitor, devo pedir-te mil desculpas, se interrompo o teu café da manhã com um necrológio. Estas linhas devem hoje comemorar a morte do Paschoal Segreto.”

Foi dessa forma que, no dia 28 de fevereiro de 1920, o escritor Pedro Costa Rego (1889-1954) iniciou sua coluna no Correio da Manhã intitulada “Um fabricante da alegria”. Continuou a coluna afirmando que a morte merecia ser chorada, pois durante toda sua vida Segreto havia investido em casas de espetáculos, produções teatrais, operetas, números de dança e parques com carrosséis, jogos e brincadeiras.

Imigrante ´que repetiu a fórmula de sucesso transformando-se em empresário, Paschoal Segreto
trouxe alegria e divertimento para o Rio de Janeiro da Belle Époque

Nascido na Itália, em 1868, Paschoal Segreto tinha 15 anos quando decidiu mudar radicalmente sua vida e embarcou, com o irmão Gaetano, para o Brasil. Após semanas dividindo com tantos outros imigrantes a terceira classe do vapor Savoie, Paschoal chegou ao Rio de Janeiro, uma cidade em expansão, mas pobre em divertimentos para a maior parte da população. Nos 36 anos em que viveu no Rio, Segreto se empenhou em mudar esse cenário e transformar a então capital do Brasil numa capital da diversão para todos, para todas as classes e para todas as idades.

O início não foi fácil, Segreto chegou a ser preso treze vezes por pequenos delitos. Aos poucos, porém, a sorte começou a lhe sorrir. De vendedor de jornais, passou a dono do diário Il Bersagliere e de vários teatros e casas de espetáculo.

Com Segreto, o Rio vai solidificando-se como um pólo econômico voltado para a indústria do entretenimento.

O passaporte para o sucesso foi o contato com pessoas influentes, incluindo um que marcaria a vida de Paschoal: José Roberto da Cunha Sales, inventor e conhecida figura da vida carioca. Criador de diversas invenções patenteadas, Cunha Sales vivia realmente da exploração do jogo ilegal, em geral variações do tradicional Jogo do Bicho. Como fachada para os jogos, montava empreendimentos como o Pantheon Ceroplástico, do qual Paschoal foi sócio, uma espécie de museu de cera de personalidades da história nacional.  Junto com o “ingresso”, a dupla vendia bilhetes de apostas para sorteios ilegais.

Sempre atento às novidades que surgiam na Europa e nos Estados Unidos, Cunha Sales e Segreto não perderam a oportunidade de registrar invenções estrangeiras como suas e colocá-las na praça o mais rápido possível. A magia das imagens em movimento gerada pelo cinema nascente não tardaria a chamar a atenção do empresário, que se encarregou de apresentar mais essa novidade aos brasileiros. No dia 8 de julho de 1896, apenas sete meses depois de os irmãos Lumière projetarem os primeiros filmes em Paris, Segreto e Cunha Sales abriram na rua do Ouvidor, número 141, no centro do Rio, a primeira sala de exibição cinematográfica do país, o “Salão Novidades de Paris”. O empreendimento rendeu dezenas de notas nos jornais e levou à formação de filas quilométricas para assistir a novidade.

Afonso Segreto, irmão de Paschoal, protagonizou mais um marco na história do cinema nacional: realizou a primeira filmagem do país. Ao retornar de uma viagem ao exterior para conhecer as novas técnicas cinematográficas e trazer equipamentos para a empresa da família, filmou a entrada da baía de Guanabara a bordo do navio Brésil. Depois dessa primeira experiência, os irmãos Paschoal e Afonso passaram a registrar regularmente celebrações cívicas e eventos sociais da elite.

Na foto acima, vemos Afonso Segreto com equipamentos para dinamizar as atividades da Empreza Paschoal Segreto

A importância histórica de Segreto nos primórdios do cinema nacional apenas amplia a imagem do empreendedor, dono de várias casas de diversão. Nesses locais, o frequentador se via diante de uma oferta de consumo irresistível: bebida, belas dançarinas de can-can e lutas greco-romanas. Segreto se encarregou de garantir opções de lazer para todos os gostos e bolsos. Enquanto os mais endinheirados assistiam a musicais no sofisticado High Life Club, localizado na rua Santo Amaro, no bairro da Glória, a população mais simples se divertia rodopiando no carrossel ou patinando sobre uma pista de gelo no Parque Fluminense, no Largo do Machado.

Segreto ergueu seu império de diversões na Praça Tiradentes, “o berço do teatro de revista”. Lá ficava um de seus cafés-concerto mais famosos, o Maison Moderne que, assim como outros estabelecimentos seus, reunia música e dança, comédias leves e exibição de filmes. Além do Maison Moderne, Segreto também detinha na área o Teatro Carlos Gomes e o arrendamento do Teatro São Pedro, um dos mais antigos da cidade.

Grande parte do sucesso de Segreto no campo do entretenimento deveu-se à rede de relações que soube tecer ao longo da vida. Seu nome era citado com freqüência pelos jornais e, em 1910, a revista Fon-fon publicou uma charge na qual anunciava a criação do ministério da Diversão e a pessoa escolhida para chefiar a nova pasta: Paschoal Segreto, é claro !

Conheça um pouco mais sobre esses “irmãos Lumière dos trópicos”, assistindo aos vídeos abaixo:

Canal 24 Quadros Por Segundo – You Tube

E agora assista ao documentário feito por estudantes de cinema. O cinema brasileiro sempre dará nosso famoso “jeitinho” de se reiventar através da criatividade de nossos jovens:

Nesse bate-papo com estudantes brasileiros, Paschoal Segreto nos conta o início da cinema no Brasil e no mundo, Canal Benício Dias – You Tube

William Martins

William Martins

William Martins é Historiador, especialista e apaixonado por Rio de Janeiro e seus divertimentos. Co-criador do Lugar de História: consultoria e projetos educacionais.